quinta-feira, 15 de agosto de 2013

Sobre o sol


By Helen Worrall

[para ler ouvindo Nigh Vision, Imagine Dragons]



27 de setembro, 2015

Se você está lendo esta carta, é porque eu estou morta.

Ok, desculpe. Eu sempre quis dizer isso.

Para falar a verdade, estou contando com a possibilidade de eu ainda estar viva. Talvez, se tudo sair como planejado, eu ainda tenha alguma chance de salvar a mim mesma, e àquilo que mais importa. E, para isso, você precisa me ajudar - seja lá quem você é.

Não sei como estão as coisas aí desse lado, mas por aqui não estão nada normais. Ou favoráveis. Desde a última troca, que aconteceu há cerca de um mês, não há mais nenhum tipo de meio de comunicação funcionando. Nenhum dos Gs, nem banda larga, nem dial-up (sim, eu tentei), nem rádio, nem fibra óptica, nem telefone, nem televisão, nem rádio, nem nada. Me sinto numa ilha deserta.

As pessoas começaram a deixar suas casas depois da primeira ou segunda troca. As coisas ficaram muito feias, muito depressa. Não deu tempo de planejar muito. A maioria delas se agrupou em shoppings e supermercados. Qualquer um com mínima instrução na cultura pop sabe que esse tipo de coisa é burrice, mas acho que, quando está acontecendo de verdade e você sente o perigo, a lógica fica um pouco falha. 

Ouvi boatos de um novo governo sendo formado. Uma ordem surgida do caos, que obviamente utilizaria da violência para funcionar. Fiquei o mais longe possível deles. 

Não só deles, na verdade. Fiquei longe de tudo. Não confiei em ninguém o bastante para pedir ajuda. Ou para ajudar. Mas a cada dia que passa eu tenho mais certeza de que essa é uma missão para quatro mãos.

Eu devia ter começado explicando quem eu sou e do que raios eu estou falando. Bom, lá vai. Meu nome é Holly Hartwell. Meu pai foi Tony Hartwell. Você já deve ter ouvido falar dele. Há um ano, quando o sol ainda não tinha passado pela primeira troca, ele era considerado pela mídia o "profeta do apocalipse".

Eu discordo desse apelido, principalmente porque ele nunca tentou evangelizar ninguém sobre o assunto. Ele simplesmente trabalhou, e trabalhou muito, para que a humanidade não se matasse quando a última troca chegasse.

E estamos muito perto dela agora, eu devo dizer.

Ele chamou a primeira troca de "agouro". Você deve ter conhecido ela como a "madrugada sem fim". Foi a época em que passamos sete dias e sete noites sob a luz fria do fim da madrugada.

Na segunda troca nós perdemos esse brilho. Ele chamou essa época de "prelúdio". Era noite, mas era uma noite clara. Eu via a lua e a eletricidade ainda funcionava. O mundo estava assustado e já começava a sofrer com a falta de preparação humana, mas ainda havia esperança.

Foi aí que ele morreu. Eu não sei como aconteceu, onde ou porque. Tudo o que eu sei é que o cachorro dele, o Butch, nunca teria voltado se ele ainda estivesse vivo.

Eu estava preparada para isso. Ele havia me instruído sobre o que fazer. Parti com Butch para bunker de meu pai, onde ele guardava o fruto da pesquisa. 

A terceira troca aconteceu logo depois da minha chegada. A eletricidade havia acabado. Vivemos por muito tempo só com a luz da lua. E tenho certeza que muitas pessoas acharam que esse era o fim da transformação. Que estávamos a salvo, finalmente. Nunca descobri como meu pai teria chamado essa troca, mas eu a apelidei de "silêncio". Era o silêncio antes da tempestade, afinal de contas.

E era mesmo. Quando a lua apagou, até mesmo eu não soube o que fazer. Viver de fogo era pouco prático e muito perigoso. E as baterias não durariam para sempre.

Então me apressei. Terminei de montar a arma, empacotei o que consegui e parti para onde estou agora.

O nariz de Butch tem me guiado fielmente até aqui, mas suas patas caninas não tem a energia que preciso para acionar a arma. E é por isso que preciso de você.

Estou enviando essa carta por Honey, meu corvo. Ele vai te achar, independentemente de onde você estiver, e vai esperar para te guiar de volta até mim.

Daqui a alguns dias, quando a última troca acontecer, vamos estar completamente no breu. Qualquer tipo de energia deixará de existir e vamos todos - animais e plantas - morrer.

E você pode me ajudar a mudar tudo isso.

Meu pai costumava dizer que, para cada criatura colocada na face da terra, há um propósito. E que, ao contrário do que parece, o ser humano não está aqui para acabar com ela. Ele acreditava que uma das coisas mais incríveis de se observar sobre nós é a energia. A forma como emanamos nossos próprios sentimentos. Nossos pensamentos. E como nossas reações se transformam em coisas físicas.

Por isso algumas pessoas eram capazes de apagar postes de energia durante um rompante de raiva. Capazes de fazer um ambiente parecer mais denso ou mais leve. De fazer as pessoas sorrirem, mesmo que contra suas vontades.

É dessa energia que eu preciso.

Despeço-me aqui, torcendo para que você siga Honey e me encontre. E que, quando dermos as mãos, nossas energias, juntas, sejam capazes de ativar a arma que salvará o planeta.

Holly.

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