segunda-feira, 30 de maio de 2016

Sobre as nossas esquisitices


Para a Ju, com carinho.





Era uma vez uma coelha estranha.

Estranha, ela era, por causa de sua cor. Enquanto todos os coelhos da floresta exibiam seus pelos brancos, ela se cobria timidamente em uma capa amarelada e comprida.

Sua cor era motivo não apenas para especulações maldosas, que ela ouvia aqui e ali, pelo canto do ouvido, enquanto cochichavam os outros coelhos escondidos, mas também para um isolamento forçado.

Em parte por não ser aceita pelos outros coelhos. E em partes por não aceitar suas próprias diferenças.

Um dia, a coelha foi ao mercado comprar batatas – sim, batatas, pois cenouras a causavam alergias (não bastasse seu pelo, descobria-se toda estranha, o que simplesmente não ajudava seu caso em sociedade). Tinha o dinheiro contato para as próximas cinco refeições e de maneira alguma podia permitir-se gastar com outra coisa, ou passaria fome.

Porém, a primeira coisa que viu ao chegar no mercado foi uma pequena barraca de adoção de filhotes de teacup pigs.

“São de graça” disse a si mesma.

“Mas dão gastos” completou o lado prudente.

“Mas são fofinhos” rebateu.

“Mas precisam de cuidado e de alimentação”.

“Mas... Mas vai me fazer companhia” apelou para si mesma. E aquele argumento nem mesmo ela podia contrafazer.

Escolheu seu porco e ao invés de batatas, comprou a ração especial daquela raça. Se tudo desse errado e o porco a odiasse, ainda poderia transformá-lo em bacon no final das contas. E não teria perdido dinheiro algum.

Porém, assim que passou mais de três minutos com o porco, percebeu que com aquela carinha fofinha e um jeito único de dizer oinc, ela simplesmente não poderia mata-lo. Com o tempo, inclusive, descobriu que ele não era apenas uma ótima companhia, mas um incrível espantador de problemas – ao ver o porco, os outros coelhos esqueciam da cor da coelha e de suas estranhezas e só pensavam em brincar e acariciar aquela pequena criatura.

Logo, a coelha tornou-se quase parte da comunidade.

Logo, também, a coelha descobriu que amava seu porco.

Um dia, quando ele ficou doente, ela correu pela floresta em busca da girafa médica, que não hesitou em atende-los.

Depois de um rápido exame, ela anunciou que o grande problema era que aquele pequeno porco simplesmente não nascera para ser minúsculo.

A ração indicada pelos animais da barraca de adoção estavam subnutrindo o pobre porco e o impedindo de crescer – uma das grandes maldades dos micro animais que ninguém ousava em comentar.

A coelha, então, teve de tomar uma decisão.

Se continuasse a alimentar o porco com a ração, ele permaneceria fofo e pequeno, e todos os coelhos a tratariam como parte da família.

Mas ele podia ficar muito fraco. E então morrer.

Ou ela podia alimentá-lo com cenouras e verduras e deixa-lo crescer. Deixa-lo ficar maior que ela própria e, quem sabe, se tornar imenso, muito menos bonitinho e muito menos atrativo para as outras criaturas da floresta.

A coelha pensou. Pensou e pensou.

E decidiu alimentar o porco com comida de verdade.

Ele cresceu e se tornou, mais do que um porco imenso, seu maior protetor.

Agora, quando os coelhos a importunavam sobre sua cor, já sem a desculpa para não fazê-lo, o porco mostrava seus dentes e fazia um furioso barulho com seu nariz de tomada. E ninguém o enfrentava.


A pequena família, da coelha e do porco, viveu estranha e feliz para todo o sempre.

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